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Hypolito,
Álvaro Moreira, Vieira Jarbas Santos, e Maria Manuela
Alves Garcia (orgs.). (2002). Trabalho docente:
formação e identidades. Pelotas-RS: Seiva
Publicações.
283 pp.
ISBN: 85-88105-07-1
Resenhado por
Audrey-Marie Schuh Moore
Universidade de
Minnesota (EUA)
Julho 15, 2002
Abstract
In Trabalho docente:
formacao e identidades, Alvaro Hypolito and his collaborators
provide vivid insights into the teaching profession through their
presentation of theories, perspectives, and case studies that not
only provide the reader with glimpses into the teaching
profession, but also question the existing structures in
education, examine how those structures affect teacher training
and teacher's ability to effectively educate children. The
contributing authors present historical, sociological, political
and cultural perspectives that raise contradictions inherent in
the "liberal" concepts of rationality and show how
over time, these concepts have led to a diminished view of women
teachers as professionals. It analyzes the dynamics of race,
ethnicity and gender from the perspective of feminization of the
profession and discusses the political implications of
conservative reforms on the teaching profession. The unifying
premise of the book is that political economic, and sociological
forces have impacted how teachers view themselves in the larger
context. If the autonomy of the teaching profession is to be
strengthened, teachers given more decision-making power over the
pedagogical process, and the needs of a global society met, those
within the field must become more critical and challenge the
existing neoliberal structure.
Sumario
Em Trabalho Docente:
formação e identidades, Álvaro Hypolito
Moreira e seus colaboradores desenvolvem instigantes e
penetrantes análises sobre a profissão do
magistério no contexto brasileiro através da
revisão de teorias e da apresentação de
alguns estudos de caso que não apenas oferecem ao leitor
diferentes visões sobre a profissão do
magistério, mas também questionam as estruturas
existentes em educação, analisando como essas
estruturas têm afetado a formação de
professores e a sua capacidade de educar efetivamente as
crianças. Os co-autores desta obra exploram em suas
análises perspectivas histórica,
sociológica, política e cultural que evidenciam as
contradições inerentes aos conceitos
"liberais" de racionalidade e demonstram como ao
longo do tempo estes conceitos têm levado a uma
visão reduzida e distorcida das mulheres educadoras como
profissionais. O livro analisa as dinâmicas de classe,
raça e gênero a partir da perspectiva de
feminização do magistério e discute
as implicações políticas das reformas
conservadoras para a profissão. A mensagem central que
permeia todos os textos reunidos nesta coletânea pode ser
assim resumida: se pretendemos que a autonomia da
profissão do magistério seja fortalecida, que os
professores tenham maior poder de decisão sobre o processo
pedagógico, e que as necessidades educacionais de toda a
sociedade sejam satisfatoriamente atendidas, então todos
aqueles diretamente envolvidos com o ensino devem se tornar mais
críticos e desafiar as estruturas neoliberais que se
tornaram hegemônicas nas últimas
décadas.
Trabalho docente:
formacao e identidades.
"….parece
ficar claro que os processos de reestruturação
educacional propostos pelas políticas neoliberais afetam
significativamente o trabalho docente. Os impactos das
políticas neoliberais para a escola pública, sobre
o trabalho docente e sobre sua cultura de trabalho, devem ser
mais estudados e criticados para a constituição de
políticas (practices) de contestação
às formas de controle sobre o trabalho de ensinar e de
fortalecimento da autonomia do trabalho docente, que poderia
significar a busca de um aumento do poder decisório dos
professors e das professoras sobre o processo
pedagógico" (p. 280).
Esta frase, que conclue
o último capítulo de Trabalho Docente,
resume bem a contribuição que este livro pretende
trazer para a literatura educacional brasileira. Em Trabalho
Docente: formação e identidades, Álvaro
Hypolito Moreira e seus colaboradores desenvolvem instigantes e
penetrantes análises sobre a profissão do
magistério no contexto brasileiro através da
revisão de teorias e da apresentação de
alguns estudos de caso que não apenas oferecem ao leitor
diferentes visões sobre a profissão do
magistério, mas também questionam as estruturas
existentes em educação, analisando como essas
estruturas têm afetado a formação de
professores e a sua capacidade de educar efetivamente as
crianças. Os co-autores desta obra exploram em suas
análises perspectivas histórica,
sociológica, política e cultural que evidenciam as
contradições inerentes aos conceitos
"liberais" de racionalidade e demonstram como ao
longo do tempo estes conceitos têm levado a uma
visão reduzida e distorcida das mulheres educadoras como
profissionais. O livro analisa as dinâmicas de classe,
raça e gênero a partir da perspectiva de
feminização do magistério e discute
as implicações políticas das reformas
conservadoras para a profissão. A premisa unificante do
livro é que forças econômicas e sociais
têm influenciado a imagem que os professores
constóem deles próprios e do seu papel na
sociedade. A mensagem central que permeia todos os textos
reunidos nesta coletânea pode ser assim resumida: se
pretendemos que a autonomia da profissão do
magistério seja fortalecida, que os professores tenham
maior poder de decisão sobre o processo
pedagógico, e que as necessidades educacionais de toda a
sociedade sejam satisfatoriamente atendidas, então todos
aqueles diretamente envolvidos com o ensino devem se tornar mais
críticos e desafiar as estruturas neoliberais que se
tornaram hegemônicas nas últimas
décadas.
Na atual literatura
educacional existe uma verdadeira obsessão com discursos
sobre identidades polarizadas e antagônicas no que diz
respeito aos profissionais do magistério –
"professora como mãe" em
oposição ao professor como "ator
racional." Estas perspectivas polares têm tido
consequências bastante específicas e significantes
para a compreensão da hierarquia de gênero
institucionalizada na profissão do magistério
(Dillabough, 1999). A partir da perspectiva dominante neoliberal,
a identidade profissional dos professores e professoras é
caracterizada em termos da sua "capacidade racional de agir
de forma competente em nome do aprendizado dos alunos e da
mudança econômica e social (Dillabough, 1999, 375).
Esta perspectiva, a qual posiciona a educação de
forma mais efetiva dentro da ordem capitalista, tem dominado a
educação e servido para restringir na
prática a autenticidade e autonomia dos profissionais da
educação. Dillabough (1999) argumenta ainda que
esta "cultura" tem servido para enfraquecer e erodir
a autenticidade política de professores, levando às
formas de controle instrumental que existem hoje na
educação. Este mecanismo político, embora
dando a impressão de liberação,
sistematicamente "des-qualifica" e desprofissionaliza
os professores ao ponto de submetê-los novas formas, mais
sutis, de exploração.
Uma perspectiva
contrária a esta visão neoliberal, apresentada por
Casey (1990) e Steedman (1985), sugere que a estrutura de ensino
tem sido definida por dualismos de gênero biologicamente
determinados que tem codificado mulheres como
"femininas"e então representa professoras como
"mães." Como resultado, o status
professional das mulheres professoras é associado ao
trabalho doméstico na esfera privada. Embora o discurso
educacional sobre as mulheres professoras é
freqüentemente essencializado por noções
tradicionais de identidade feminina, o paradoxo é que tais
noções são construídas como
irracionais e guiadas por emoções. Em
decorrência disso, a construção social do
status professional das mulheres promove a
naturalização da identidade da mulher educadora
como sendo inferior à do homem educador (Dillabough,
1999). O dualismo de gênero inerente à
profissão do magistério é então
"representado de múltiplas formas; mulheres
professoras como subordinadas, como mães, e como bode
expiatório para o que não tem sido alcançado
na educação"(Dillabough, 1999, 385). Em
"Entre a casa e a escola: educadoras do ensino
fundamental na periferia de São
Paulo"(Capítulo 8), Marília Pinto de
Carvalho traz para o primeiro plano diversos aspectos negativos
que estão entremeados no debate
público-doméstico, tais como: a
substituição de competência técnica
por simples dedicação; o uso ideológico
desta perspectiva para desmobilizar organizações
coletivas de professores e facilitar a aceitação e
o conformismo em face aos baixos salários do
magistério; a falta de definição entre os
professionais da educação nas escolas. Carvalho
questiona o conceito de "professor como ator
racional," argumentando que:
Em algum casos, eles
só aparecem como negativos se estamos comparando a escola
e as professoras com um padrão considerado positivo e esse
padrão é que precisa ser questionado, levando-nos a
uma revisão dos nossos conceitos de bom profissional, de
competência, de docilidade ou militância e de
relações professionais adequadas (p.
238).
Álvaro Hypolito
Moreira e os demais colaboradores do livro mostram com realismo
como as professoras experimenta no Brasil tais hierarquias de
gênero. Diversos capítulos oferecem ao leitor uma
visão privilegiada das transformações que
ocorreram na profissão de magistério na virada do
século 20 e ilustram as complicadas relações
de gênero existentes na carreira docente hoje. Os conceitos
de "des-qualificação" e
desvalorização da profissão do
magistério começam a aparecer em
"Profisionalismo, escola normal,
feminização e femilização:
magistério sul-rio-grandense de instrução
pública – 1880-1935"(Capítulo 3),
de autoria de Elomar Tambara. Este capítulo revela como os
professores eram certificados até o advento da
República e a "desqualificação"
que ocorreu com a passagem da chamada Velha República. De
acordo com a perspectiva da autora, embora estas mudanças
significaram um inquestionável avanço para as
mulheres naquele período, permitindo que elas ingressassem
no mercado de trabalho, o estabelecimento da ideologia de
feminização associada com mecanismos
políticos que estimularam a
"desqualificação profissional
consubstanciados, em especial, na cosmovisão
dominante"(p. 94) que ocorreu através da
implantação das Escolas Normais significou a
consolidação do magistério de nível
primário, fazendo dele uma profissão
"secundária."
As
relações de gênero e a forma como se deu a
reestruturação das escolas sob a égide da
ideologia neoliberal são discutidos em
"Profissionais da educação, cultura
escolar e relações de gênero: a
relação entre os inspetores escolares e as
diretoras de grupos em Belo Horizonte na Primeira
República"(Capítulo 4). Luciano Mendes de
Faria Filho discute as relações entre inspetores
escolares e diretoras de grupos no sistema educacional de Belo
Horizonte no começo do século XX quando o sistema
público de educação primária e a
cultura das escolas estavam sendo reestruturadas para atender as
necessidades de uma sociedade em processo de
modernização e as demandas do emergente sistema
capitalista brasileiro. A idéia do "professor como
um ator racional" começa a aparecer durante este
período e as tensões entre professores e diretores
de escola, de um lado, e os inspetores escolares e representantes
da Secretaria de Educação (majoritariamente
homens), por outro lado, podiam ser observadas. Farias argumenta
que no meio destas tensões, intensificadas pelo processo
de reestruturação do sistema de ensino, no qual
diferentes grupos disputavam a melhor forma de reorganizar as
escolas (i.e, dividir os estudantes em grupos, selecionar o
currículo apropriado, distribuir o tempo escolar, etc.),
os professores também estavam desenvolvendo suas
identidades profissionais – a identidade de educadora como
mãe, e como bode expiatório para fracassos
educacionais.
No texto
"Memória e ensino: formação
docente, trajetórias profissionais e práticas
pedagógicas pela voz de antigas professoras
primárias"(Capítulo 5), Eliane Peres
utiliza história oral para analisar
formação, trajetórias de carreira e
práticas pedagógicas de professoras
primárias na década de 30. Este capítulo
oferece ao leitor uma visão histórica sobre o
perfil do magistério na primeira metade do século
XX, enfatizando os desafios, obstáculos, e conquistas das
professoras naquele período. As próprias
professoras relatam que apesar dos obstáculos que elas
enfrentavam, para muitas a profissão do magistério
representava a única alternativa para quebrar as barreiras
e iniquidades que bloqueavam o ingresso das mulheres no mercado
de trabalho. Conforme Peres corretamente assinala, "essa
geração de mulheres-professoras foi precursora de
lutas e embates posteriores"(p.136). Este capítulo,
que contém a essência da parte histórica de
Trabalho Docente, ajuda o leitor a compreender o que
significava ser professora, os desafios que elas enfrentavam, e
como a feminização da profissão teve um
profundo impacto sobre o magistério.
Além das
questões de gênero que têm permeado a
feminização e a professionalização do
magistério, o Brasil, assim como o restante do mundo,
têm testemunhado a intensificação do processo
de globalização em todas as suas diferentes
dimensões – econômica, cultural, social, e
política. Os impactos deste processo sobre os sistemas
nacionais de educação não devem ser
subestimados. De fato, as profundas mudanças
políticas e econômicas trazidas pela
globalização tem sido acompanhadas por um
declínio na sociabilidade do ensino e, paradoxalmente, por
uma forte pressão sobre os professores para que adotem
pedagogias mais tradicionais, com um foco nos resultados ao
invés do processo de ensino em si (Dillabough, 1999). Cada
vez mais, os esforços de reestruturação dos
sistemas educacionais são concebidos em respostas aos
imperativos da globalização, determinados em grande
medida pela forças de mercado. As escolas são o
estuário onde convergem e desembocam as pressões e
tensões provocadas pelas rápidas
transformações econômica e
tecnológicas que movem o processo de
globalização. A sociedade de hoje requer
trabalhadores que tenham capacidade de tomar decisões com
informações inperfeitas, monitar seu próprio
trabalho e agir de forma empreendedora e criativa. Obviamente, os
profissionais da educação são diretamente
afetados pelas novas demandas endereçadas às
escolas.
Vários
capítulos em Trabalho Docente levantam
questões sobre a estrutura que o neoliberalismo tem criado
na área educacional, argumentando que significantes
mudanças estruturais e curriculares precisam ser feitas
para que a educação possa atender as necessidades
de um mundo em crescente transformação e
integração. O texto
"Educação pos-crítica e
formação docente" (Capítulo 10),
escrito por Tomaz Tadeu da Silva, sublinha a necessidade de se
buscar novos e criativos caminhos para o desenvolvimento do
currículo escolar. Na sua discussão sobre os
impactos do pos-modernismo sobre o currículo e a
formação de professores, bem como os impasses da
teoria crítica em educação face aos ataques
da ideologia neoliberal instalada hoje na educação
pública, Silva argumenta que
…o
currículo é o espaço onde se corporificam
formas de conhecimento e de saber. O currículo é
um dos locais privilegiados onde se entrecruzam saber e poder,
representação e domínio, discurso e
regulação. É também no
currículo que se condensam realções de poder
que são crucias para o processo de formação
de subjectividades sociais. Em suma, currículo, poder e
processo de formação estão mutuamente
implicados (p. 268).
Silva explora estas
intrincadas relações na sua discussão sobre
como a formação de professores deveria
prepará-los para lidar com as transformações
enfrentadas pela sociedade moderna. Ele argumenta que um
currículo "crítico" deveria ser
centrado em torno de questões e problemas do nosso tempo
tais como AIDS, pobreza, violência, e
destruição do meio-ambiente, para nomear alguns. Ao
promover a "descolonização" do
currículo, a educação se abre para a
insurreição contra todas as forma de
dominação e para a transgressão de novas
fronteiras, ao invés de se fechar a si mesma como
mecanismo de reprodução da ideologia
dominante.
Álvaro Hypolito
Moreira, em "Reestruturação educativa e
trabalho docente: autonomia, contestação e
controle" (Capítulo 11), contribui para este
tema ao observar como as reformas curriculares neoliberal no
Brasil têm sistematicamente reforçado o status
quo. Ele argumenta que os professores e outros agentes
educacionais precisam reinterpretar, definir, e decidir o
"que" é educação e
"como" o processo educacional deve ser desenvolvido.
Embora os capítulos anteriores informam e contribuem para
um profundo entendimento dos processos educacionais, os dois
capítulos finais desenham juntos as diferentes
possibilidades teóricas e políticas que deveriam
ser consideradas quando são examinadas novas
orientações para educação e, mais
especificamente, para formação de professores.
Conforme os autores se propuseram a oferecer, o livro faz sua
contribuição ao debate educacional sobre trabalho
docente e a profissão do magistério, colocando o
leitor em contato com uma variedade de discussões e
perspectivas teóricas concorrentes que, sem dúvida,
aprofundam o entendimento e sugerem novas formas de olhar a
profissão do magistério – particularmente a
partir de uma perspectiva de gênero. O livro mostra as
complexidades inerentes à profissão do
magistério e examina como dualismos de gênero
historicamente determinados serviram como mecanismos de
construção de identidades no campo do
magistério, levando o leitor a questionar as estruturas
existentes.
Embora este livro tenha
muitas qualidades e pontos fortes e por essa razão sua
leitura é recomendada aos que trabalham na área de
educação, existem algumas fragilidades e
limitações importantes que deveriam ser discutidas.
Primeiro, embora seja importante entender as diferentes teorias
existentes para tratar das questões de classe, raça
e gênero, o livro oferece poucos exemplos práticos
de como alguns destes problemas poderiam ser superados ou
enfrentados por meio de mudanças estruturais. No
capítulo "Raça, classe e gênero na
pesquisa educacional: por uma posição paralelista
não sincornista" (Capítulo 1), Michael
Apple argumenta que na literatura educacional em geral existem
poucos exemplos práticos ou modelos que tenham se
debruçado sobre as complexas intersecções
entre educação e diferencial de poder. Embora
alguns estudos de caso históricos sejam usados para
ilustrar as mudanças e transformações que
ocorreram na área educacional no Brasil, escassas
conexões entre teoria e prática são feitas
ao longo do livro.
Esta obra coletiva
poderia ter resultado num guia mais prático se incluisse
exemplos específicos de como certos esforços de
reformas, políticas ou programas educacionais têm ou
não têm enfrentado as diversas questões
discutidas ao longo dos textos de diferentes autores reunidos
neste volume. Por exemplo, Jacinta Reis da Silva, no
capítulo entitulado "Relações
raciais/étnicas e práticas pedagógicas: Uma
relação a ser discutida" (Capítulo
9), analisa como atitudes de colegas em relação a
crianças provenientes de minorias raciais ou grupos
socialmente excluídos e marginalizados freqüentemente
fazem com que elas se sintam menos aceitas no ambiente escolar.
Ela sustenta que os professores, aos se deparar como esse tipo de
situação, não sabem a melhor forma de
enfrentá-las. Essas atitudes criam uma
sensação de insegurança entre estudantes que
pertence a minorias raciais e/ou famílias pobres, o que
compromete sua habilidade de aprender. Embora a
apresentação destas idéias seja extremamente
importante para o entendimento das relações de
raça no espaço da escola, o capítulo teria
sido mais prático se a autora tivesse incluído
exemplos de como estas relações poderiam ser
facilitadas para beneficiar todos os estudantes em sala de aula.
Certamente a utilização de alguns exemplos
práticos ao longo do livro teria ampliado seu alcance e
fortalecido sua relevância e e contribuição
na área.
Um segundo aspecto no
qual o livro deixa uma importante lacuna diz respeito à
dimensão institucional das discriminações
raciais e as hierarquias de gênero. De fato, quando as
questões de gênero e raça são
examinadas, é negligenciado o fato de que existem
importantes barreiras institucionais na sociedade que influenciam
a habilidade das mulheres e das minorias adquirirem poder. Mais
especificamente, dois conceitos que passam ao largo das
análises – os conceitos de "privilégio
masculino" e "privilégio dos brancos"
– poderiam contribuir para colocar em evidência estas
barreiras institucionais. Peggy McIntosh (1990), no seu artigo
White Privilege: Unpacking the Invisible Knapsack,
apresenta a seguinte consideração:
Refletindo sobre o
não-reconhecido privilégio masculino como um
fenômeno, eu cheguei à conclusão que, uma vez
que as hierarquias na nossa sociedade são
entrelaçadas, provavelmente existe um fenômeno de
privilégio dos brancos que é igualmente negado e
protegido. Como uma pessoa branca, eu me dei conta que eu tinha
sido ensinada sobre racismo como algo que coloca os outros em
desvantagem, mas não fui ensinada a ver um dos seus
aspectos corolários, o privilégio branco, o que me
coloca em vantagem (p.31).
O conceito de
privilégio branco é definido como sendo similar a
uma mochila invisível e sem peso com provisões
especiais, como mapas, passaportes, guias, ferramentas e cheques
em branco que são dadas à população
caucasiana (McIntosh, 1990). Estas inerentes estruturas
institucionais fazem este grupo racial se sentir mais confiante e
confortável ao mesmo tempo que fazem outros grupos
frequentemente se sentirem alienados e sem confiança
(McIntosh, 1990). O conceito de privilégio e as
diferenças entre poder conquistado e herdado estão
igualmente presentes nas relações de gênero.
Poder decorrente de privilégios (poder
não-conquistado ), tais como aquele proveniente do fato de
ser branco ou homem, pode parecer força, mas na verdade
é uma permissão para evadir ou dominar (McIntosh,
1990). McIntosh (1990) argumenta que para começar a
redesenhar o sistema social de forma a eliminar os
privilégios que originan hierarquias e iniquidades,
nós precisamos em primeiro lugar reconhecer estas
dimensões invisíveis e superar os silêncios e
negações envolvendo privilégios que
são sustentados por mecanismos
políticos-institucionais. MacIntosh argumenta ainda que a
confiança associada ao privilégio dos brancos
é proveniente de coisas simples como ser capaz de se mudar
para uma área residencial da sua escolha e que é
co-habitada pela sua própria raça; em qualquer
instituição, se você perguntar para falar com
o "chefe" ou com quem está "no
comando," você pode estar quase certo que eles
vão ser da mesma raça sua. Além disso,
filmes, programas de TV, propaganda, livros, bonecas, revistas
retratam primariamente pessoas da sua raça. Embora o
conceito de privilégio é elusivo, até que a
sociedade comece a "descolonizar" as estruturas
institucionais e a "desfazer esta mochila
invisível," ela não vai abrir espaços
para insurreição contra as diferentes formas de
dominação e a transgressão de novas
fronteiras.
Embora o livro
"Trabalho Docente: formação e
identidades" revolva em torno de questões de
raça e etnicidade, a discussão das barreiras
institucionais e os conceitos de privilégio branco foram
completamente negligenciados. O acréscimo de um
capítulo que examinasse estes conceitos, especificamente
dentro do contexto da educação e da
profissão do magistério, teria aumentado
significantemente a contribuição do livro para o
entendimento de raça e gênero na
educação e possivemente para o entendimento de
"como" criar um novo currículo que atenda
melhor as necessidades dos estudantes e professores de hoje. Os
conceitos de gênero, raça e etnicidade e os seus
impactos nos professores, na formação de
professores e estudantes poderia ter sido elaborados em maior
profundidade para fazer uma grande
contribuição.
Em conclusão,
"Trabalho Docente: formação e
identidades" é uma leitura altamente recomendada
para estudantes e pesquisadores interessados em ampliar o seu
conhecimento sobre a história do magistério no
Brasil e, mais especificamente, sobre como as forças
econômicas, políticas, sociais e culturais
combinaram-se para criar identidades de gênero e
raça entre os professores. O livro contém uma
sólida introdução que enuncia tanto os seus
objetivos quanto o conteúdo dos textos que integram o
volume, dois capítulos teóricos que oferecem ao
leitor noções básicas sobre as principais
teorias de gênero, raça economia e política,
e 9 capítulos adicionais que apresentam, sob diferentes
perspectivas, uma visão panorâmica sobre como
pós-modernismo, teoria crítica e neo-liberalismo
têm afetado a profissão do
magistério.
Referências
bibliográficas
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Feminist Economics, 6, 3, vii-xviii,
Casey, K. (1990).
Teacher as mother: curriculum theorizing in the life histories of
contemporary women teachers, Cambridge Journal of
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Dillabough, Jo-Anne.
(1999). Gender politics, conceptions of the modern teacher:
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eletrônica] British Journal of Sociology of
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McIntosh, Peggy. (1990).
White privilege: unpacking the invisible knapsack.
Independent School, winter, 31-36.
Steedman, C. (1985). The
mother made conscious: the historical development of a
primary school pedagogy, History Workshop Journal, 20,
149-163.
Sobre a autora desta
resenha
Audrey-Marie Schuh Moore
está completando seu PhD na Faculdade de
Educação e Desenvolvimento Humano da Universidade
de Minnesota (EUA). Suas áreas de interesse são
desenvolvimento educacional comparado, desenvolvimento
econômico e rural, reformas e políticas relacionadas
a crianças da área rural em países em
desenvolvimento, e o papel da educação nos
processos de desenvolvimento nacional. Ela é também
especialista de ensino.
Reseñas Educativas/ Resenhas Educativas
publica reseñas de libros sobre educación, cubriendo
tanto trabajos académicos como practicas educativas.
Todas las informaciones son evaluadas por los editores:
Editor para Español y Portugués
Gustavo E. Fischman
Arizona State University
Editor General (inglés)
Gene V Glass
Arizona State University
Reseñas Educativas es firmante de la Budapest Open Access Initiative.
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