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Gasparin, J. L. (2002). Uma didática para a
pedagogia histórico-crítica. Campinas, Spain:
Editora Autores Associados.
ISBN: 85-7496-054-3
212 páginas
Resenhado por José Florêncio Rodrigues
Jr.
3 de mayo de 2003
Abstract
Historical-critical pedagogy (h-c p) is presented in a version
aimed to elementary and secondary school teachers, not scholars.
In each of the three parts, the author highlights the theoretical
foundation, the practical procedures and an example. Part one
concerns social practice and deals with the current level of
understanding of the student regarding a scientific topic. Part
two, theory: the proximal zone of the student expands on
Vigotski’s learning theory as it applies to
historical-critical pedagogy. In particular, Gasparin, the
author, goes into detail about the proximal zone, the role of
imitation in instruction and learning, among other concepts.
Part three elaborates on social practice: the student’s
current level of understanding. The author discusses how,
through the process of teaching based on historical-critical
pedagogy, both student and teacher change their view of
reality.
Resumo
Ao apresentar o livro em epígrafe, o prof. Demerval
Saviani, um dos expoentes da Pedagogia
Histórico-Crítica (passarei a referir-me a essa
expressão daqui por diante mediante a sigla ph-c),
antevê três tipos de leitores que poderão
beneficiar-se da leitura da obra: os que compartilham do
ideário daquela pedagogia, os que ainda não a conhecem
e, finalmente, os que a ela se opõem. Para cada
audiência, a leitura proporcionaria benefícios: para o
primeiro grupo, o de auxiliá-los na prática da ph-c;
para o segundo, ler o livro proporcionaria o benefício de
pô-los em contato com ela; finalmente, para a audiência
dos que se opõem à ph-c, representaria um saudável
confronto com a concepção pedagógica à qual
estão perfilados. Coloco-me na segunda categoria de
leitor. Confesso que conheço pouco a Pedagogia
Histórico-Crítica. Ler o livro de Gasparin é,
portanto, uma oportunidade de inteirar-me dessa escola de
pedagogia.
Proponho-me, nessa resenha, a apreciar o livro de Gasparin sob
três ângulos. No primeiro, buscarei retratar
concisamente a estrutura da obra. No segundo, e atendo-me à
posição de aprendiz da ph-c, assinalo o que aprendi da
e sobre a referida teoria. No terceiro, apontarei aspectos que
me suscitaram questões e dúvidas.
A Pedagogia Histórico-Crítica ao Acesso do
Professor
Um Retrato 2x2 do Livro
Uma didática para a pedagogia
histórico-crítica constitui-se de três partes:
(I) Prática social: nível de desenvolvimento atual do
educando; (II) Teoria: zona de desenvolvimento imediato do
educando e (III) Prática social: nível de
desenvolvimento atual do educando. Elas constituem uma
seqüência a ser percorrida na instrução.
Consistente com essa estrutura, cada parte é composta de
três componentes, ou seja, fundamentos teóricos,
procedimentos práticos e exemplo. Assim, na primeira parte
Gasparin discute a aprendizagem significativa, construto presente
em conceptualizações teóricas sobre a
aprendizagem; por exemplo, na de Ausubel, na de Vigotski, como na
de Freire. No tópico seguinte Gasparin propõe
procedimentos didáticos para se construir a ponte entre o
ambiente e contexto do aluno e o saber científico com o qual
será confrontado. Conclui com um exemplo de uma unidade
conduzida de acordo com este paradigma; a unidade é sobre a
água e ela voltará a ser usada como exemplo nas outras
partes do livro. É oportuno observar o emprego acentuado da
abordagem indutiva na condução da
instrução.
Na segunda parte, Problematização, Gasparin lida com
dilemas que confrontam o professor que se propõe orientar-se
pela ph-c; por exemplo, como posicionar-se face ao dilema
situação concreta do aluno versus o currículo
oficial do município ou estado. O autor propugna que se
privilegie o primeiro elemento ao qual o segundo deve
subordinar-se: “A Problematização tem como
finalidade selecionar as principais interrogações
levantadas na prática social a respeito de determinado
conteúdo”(p.37).
Instrumentalização, a terceira parte do livro, trata
dos caminhos a serem explorados a fim de promover a aprendizagem
significativa. Esta parte do livro é a mais extensa, sendo
integrada por quatro capítulos. Neste capítulo,
Gasparin apóia-se em Vigotski, realçando o papel de
conceitos tais como zona de desenvolvimento imediato,
cooperação, imitação, entre outros. O quarto
capítulo, Catarse, constitui o momento de síntese, ou
seja, da convergência do senso comum, da experiência
pregressa do aluno, com o saber científico.
O Que Aprendi da Pedagogia Histórico-Crítica
Fiquei surpreso ao ler Uma didática para a pedagogia
histórico-crítica com posicionamentos dessa
pedagogia os quais, por conta de informação que
possuía, mostraram que esta informação era
imprecisa, incorreta. Nesse particular, ler o livro trouxe
precisamente o benefício de que fala o Prof. Saviani.
Assinalo aqui três desses aspectos.
O primeiro, a ph-c não dispensa nem despreza elementos e
procedimentos próprios de outras escolas que a precederam.
Entre esses elementos e procedimentos assinalo dois: (a) o uso de
objetivos de ensino como balizas para a instrução,
particularmente o emprego da Taxonomia de Objetivos Educacionais
como referencial para a instrução e a aprendizagem e
(b) o emprego de recursos oriundos do construto clareza na
instrução na prática docente. Explicitando.
Até o presente o conhecimento da ph-c de que dispunha me
dava conta de que os referidos elementos, provenientes que
são da escola chamada tecnicista, eram repudiados pelos
pensadores e formuladores da ph-c. Haveria até mesmo
razões de natureza ideológica que indispunham uma e
outra orientações. Entretanto, Gasparin me demonstra o
contrário. No que se refere a objetivos de ensino ele
recorre a eles no capítulo 1 (pp. 27-28), incluindo tanto os
do domínio cognitivo como do afetivo. No exemplo da unidade
da água, tanto há objetivos que lidam com
cognição, por exemplo, distinguir a água de outros
líquidos usados na vida cotidiana, como há objetivo
lidando com aspectos éticos, valorativos: aplicar os
conhecimentos adquiridos, economizando água.
Segundo aspecto da ph-c constituindo aprendizagem para mim foi
o papel relevante atribuído ao professor como modelo na
instrução; ou seja, a importância da
imitação como parte integrante da aprendizagem
significativa. Surpreende na leitura da sessão 1.3. (A
imitação e suas conseqüências
pedagógicas) o papel atribuído à
imitação na instrução e na aprendizagem. O
autor recorre, em numerosas citações, ao psicólogo
russo Vigotski, um dos fundadores da pedagogia
histórico-crítica, para construir uma
argumentação consolidada, justificando o papel da
imitação na construção do saber
científico do aluno.
Digo surpreender, porque é sabido como, no ambiente
educacional, reputa-se a imitação como um procedimento
mecânico, nocivo, incapaz de engendrar aprendizagem
significativa. Ao contrário disso, argumenta o autor,
estribado em Vigotski, que a imitação põe o aluno
em contato com a herança histórica do saber humano. Ao
professor cabe, em conseqüência, criar mecanismos que
estimulem o aluno a imitá-lo. Funciona, dessa forma, o
professor, não apenas como um gerador da aprendizagem
cognitiva; mais ainda, ele é o paradigma da
assimilação de valores morais e éticos.
Aliás, esse aspecto é realçado no estudo de
Dallegrave (2000) sobre o desenvolvimento moral de escolares do
ensino médio.
Foi, também, importante aprendizagem para mim dar-me
conta de que, a despeito da escassez de professores capazes de
realizar a ph-c em suas salas de aula, existem aqueles que logram
produzir a aprendizagem significativa intentada pela ph-c.
Recentemente, uma orientanda de mestrado realizou seu projeto de
dissertação examinando a prática de professores de
Matemática de 5ª a 8ª séries ao conduzirem a
instrução com vistas à aquisição de
competências (Barbosa, 2002). Registra, a pesquisadora,
relatos de docentes sobre alunos que, por exemplo, ao estudarem o
conteúdo escolar “juros” subseqüentemente
põem esse conteúdo em prática, ajudando os pais a
decidir se devem ou não realizar compra cujo valor encerra
juros elevados. Tem-se aí um caso emblemático daquilo
que Gasparin preconiza ao tratar da catarse na ph-c.
Questões e Dúvidas Suscitadas pela Leitura
Três aspectos suscitaram-me questões na leitura do
livro de Gasparin. Um é de ordem formal, textual; o
segundo, de ordem ético-filosófica e o terceiro, de
ordem prática.
Em primeiro lugar, o terceiro capítulo é o mais
extenso dos quatro que integram o livro. É apropriado que
assim seja, porque, é nele que se apresentam os
procedimentos e materiais a serem explorados na ph-c.
Entretanto, nele se contêm numerosas citações. Em
75 páginas existem, pelo menos, 68 citações apenas
de Vigotski. Somadas às dos demais autores chega-se a cerca
de 80 citações. Para a minha leitura, esse elevado
número de citações teve dois efeitos
indesejáveis. Primeiro, desviaram-me a atenção do
foco do capítulo, ou seja, a instrumentação da
pedagogia. Segundo, tornou a leitura pesada, densa e, por outro
lado, deu-lhe um aspecto fragmentário.
Exponho o segundo aspecto, o de natureza
ético-filosófica. A p h-c presume, segundo Gasparin,
uma adesão do docente a uma dada ideologia, à qual ela
está organicamente unida. Em dois momentos o autor advoga
adesão prévia do professor a um determinado alinhamento
ideológico: “os alunos são informados de que o
conteúdo será abordado numa determinada linha
política, através do processo
teórico-metodológico que tem como suporte o
materialismo histórico, com finalidade de
transformação social” (p. 22). Pergunto-me:
é possível contar com essa adesão universalmente?
Parece que não. E nem isso seria desejável, pois
obstaria a implantação, na escola, de um ambiente de
pluralidade. Além disso, a julgar pelos valores propugnados
pela ph-c, esse tipo de compromisso ideológico é
desnecessário, além de desvantajoso. Ou seja, acredito
ser possível um(a) professor(a) realizar instrução
nos moldes da ph-c sem alinhar-se à ideologia referida pelo
autor.
A última questão é de natureza prática.
Não me parece padecer dúvida o mérito da ph-c. A
aprendizagem significativa que ela pretende promover, com a
subseqüente imbricação do saber científico
com a realidade constitui o que de melhor se pode esperar da
instrução e a conseqüente aprendizagem. O
problema parece residir no professor; mais precisamente, na
condição e capacidade do professor de realizar a ph-c
no contexto de salas de aula comuns. Efetivamente, em recente
revisão de estudos, Windschitl (2002) aponta alguns dilemas
relacionados com a prática do construtivismo, escola à
qual se liga intimamente a ph-c. Entre os dilemas enumerados por
aquele autor estão a incapacidade do professor, a
indiferença do aluno e a resistência da comunidade. A
argumentação de Windschitl é construída
solidamente e merece ser considerada ao se decidir sobre a
adoção da ph-c.
Referências
Barbosa, M. J. (2002). Competências de ensino aplicadas
por professores de Matemática, definidas com base em
incidentes críticos. Dissertação de Mestrado:
Universidade Católica de Brasília.
Dallegrave, G. M.R. (2000). Desenvolvimento moral do
adolescente. Caxias do Sul, RS: Editora da Universidade de
Caxias do Sul.
Windschitl, M. (2002). Framing construtivism in practice as
the negotiation of dilemmas: an analysis of the conceptual,
pedagogical, cultural, and political challenges facing teachers.
Review of Educational Research, 72(2), 131-175.
Dados do autor do livro. João Luiz Gasparin.
Nasceu em Guaporé, RS. Licenciou-se em filosofia pela
Fidene, atual Universidade de Ijuí-UNIJUÍ, RS--e em
letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Paranavaí, PR. Na Universidade de Brasília fez curso
de especialização em métodos e técnicas de
ensino.
Realizou seu mestrado em educação na PUC
do Rio Grande do Sul e o doutorado na PUC de São Paulo, onde
defendeu a tese Comênio ou da arte de ensinar tudo a todos
totalmente. Desde 1974 é professor do Centro de
ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Estaudal de
Maringá (PR), onde leciona didática nos cursos de
graduação e metodologia do ensino superior nos cursos
de pós-graduação. Integra o corpo docente do
programa de pós-graduação em educação,
bem como do mestrado em direito da mesma universidade.
Publicou, além de diversos artigos na área
educaional, os livros Comênio ou da arte de ensinar tudo a
todos e Comênio-a emergência da modernidade na
educação..
Dados do autor da resenha. José Florêncio
Rodrigues Jr. é graduado em Teologia, Composição e
Regência e Filosofia. Mestre e doutor em Educação
pela Emory University, Atlanta, Georgia, EUA.
Lecionou na Universidade Federal do Piauí, na
Universidade de Brasília e, desde 1994 até o presente,
na Universidade Católica de Brasília. Entre as
disciplinas lecionadas, Metodologia da Educação
Superior: Instrução Centrada no Professor, Metodologia
da Educação Superior: Instrução Centrada no
Grupo, Metodologia da Educação Superior:
Instrução Centrada no Aluno e Avaliação em
Educação. Publicou A Taxonomia de Objetivos
Educacionais: um manual para o usuário e Manual para a
formação do instrutor.
Reseñas Educativas/ Resenhas Educativas
publica reseñas de libros sobre educación, cubriendo
tanto trabajos académicos como practicas educativas.
Todas las informaciones son evaluadas por los editores:
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Gustavo E. Fischman
Arizona State University
Editor General (inglés)
Gene V Glass
Arizona State University
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