jueves, 20 de marzo de 2025

Frigotto, G. (Org.)  (1998). Educação e crise do trabalho:  Perspectivas de final de século. Resenhado por Cesar Augusto Rossatto

 

Frigotto, G. (Org.)  (1998). Educação e crise do trabalho:  Perspectivas de final de século. Petropolis, Brazil: RJ: Vozes.

230 pp.

ISBN 85-326-2027-2

Resenhado por Cesar Augusto Rossatto
Universidade do Texas em El Paso (UTEP)

August 18, 2002

Educação e crise do trabalho: Perspectivas de final de século é uma coletânia de vozes que busca a interlocução com agentes sociais interessados em um discurso com base ou tom marxista, procurando relacionar determinantes históricos que explicam as desigualdades sociais, econômicas, culturais e fatores de exclusão no sistema educacional. Este livro também procura oferecer alternativas sociais de caráter igualitário, socialista e solidário. Tais alternativas almejam ampliar as esferas democráticas públicas para facilitar o acesso das várias camadas sociais, minimizar um sistema de classes polarizadas, possibilitar o direito à educação básica e tecno-profissional, além do direito à cidadania, à saúde, à cultura, ao lazer, à aposentadoria, o acesso ao trabalho e a salários dignos. Nesse contexto de fatores interconectados, Educação e crise do trabalho: Perspectivas de final de século examina as relações do mundo de produção e reprodução da vida humana, seus aspectos formativos e processos educacionais. Esta coletânea oferece uma análise e perspectivas voltadas para realidades centrais básicas do desenvolvimento e subdesenvolvimento de países capitalistas como a Itália, o México e os Estados Unidos e mais particularmente, o Brasil ou a América Latina. A experiência da globalização nestas nações e continentes diferentes, é evidentemente, abordada de forma distinta. Países desenvolvidos adaptam-se mais facilmente à flutuações e mudanças econômicas, enquanto países em desenvolvimento reagem a estas mudancas de modos que podem ser literalmente catastróficos. Não querendo dizer atraves do uso do termo "países em desenvolvimentos" que estes países de "terceiro mundo" necessariamente tenham que desenvolver esta identidade capitalista selvagem de países de "primeiro mundo." Pois, no Brasil, em Porto Alegre, por exemplo, com o desenvolvimento do orçamento participativo—o processo democratico exemplar e' um modelo para o mundo e para os países de "primeiro mundo" (Rossatto, 2001). Demodos que esses termos necessitam ser revisados.

De forma suscinta, o ponto central deste livro é que a industrialização nestes países cuja transição para uma economia globalizada e industrializada ainda não foi efetuada completamente, é um luxo exclusivo de uma parcela da população economicamente dominante, em contraste com a exclusão da maioria de seus habitantes. Os autores afirmam que a continuação da lógica do paradigma capitalista somente sobrevive em detrimento e sacrificio do meio ambiente, com a destruição e esterilização do trabalho e o crescimento da exclusão global. Em outras palavras, a globalização concentra e diminui empregos, através da exclusão profissional na maior parte do mundo e através da ampliação de modelos de desenvolvimento econômico e cultural desiguais. Desta maneira, uma das propostas de ação central dos autores é a formação de projetos anti-hegemônicos. Se por um lado o sistema educacional favorece a escolarização com o objetivo central da empregabilidade ou do treinamento profissional, então novas demandas devem favorecer uma educação que prepare a pessoa para enfrentar situações contemporâneas, novas e imprevisíveis, além de inserção em uma força de trabalho de natureza tecnologica e em constante mudança. O raciocínio da hegemonia presente, das políticas corporativistas neo-liberais, fomentam uma força de trabalho limitada em suas possibilidades funcionais. Nesta, somente a empregabilidade flexível favorecida pela competência individual pode garantir o sucesso das relações do mundo de trabalho. Infelizmente, os ditames sócio-econômicos atuais da globalizacão da economia negam à maioria da população mundial a chance de conquistar formas de competência individual através da educação e de oportunidades igualitárias. Neste sentido, a expressão "mercado livre" (free market) é uma contradição, porque, na realidade, o mercado nao é livre para todos, e sim uma estrutura que privilegia alguns em posição de poder ou em vantagens econômicas, perpetuando o acesso dos mesmos aos meios de prosperidade econômica às custas dos meios de outros.

Assim, de acordo com os autores, é necessário e urgente o estabelecimento de um diálogo entre profissionais competentes em várias áreas e em diferentes especialidades, a fim de repensar as teorias da educação dentro de um contexto mais abrangente, com visões e entendimentos de perspectivas globais. O objetivo de uma pedagogia moderna é um processo complexo de humanização, que visa assistir o educando com qualidade, em sua trajetória. Educar, de acordo com este livro, nada mais é do que humanizar, para caminhar em direção à emancipação, à autonomia responsável, à moralidade e à ética do sujeito. Se a educação tecno-profissional promovida pelo neoliberalismo e a globalização é desumanizante, então a teoria e a prática pedagógica anti-hegemônica devem ajudar o educando a ser mais humano.

Neste final de século, no Brasil, a educação aumentou o acesso da clientela à escola, mas por outro lado, os processos educativos propostos a metodologia pedagógica e tornaram pior a qualidade da educação, espelhando seu processo nos Estados Unidos, o qual se move desenfreadamente em direção à padronização. Em outras palavras, este processo tem aumentado a oferta educativa, mas sistematicamente negado uma educação de qualidade. Estas medidas tornaram possível a muitas pessoas completar processos de escolarização e até mesmo obtenção de um diploma universitário, mas, ao mesmo tempo, desvalorizaram estes diplomas através do enfraquecimento da qualidade e do conteúdo do processo educacional em nome da conveniência e do pragmatismo. Este processo reduziu, então, a eficácia e a empregabilidade da força de trabalho. A ideologia subjacente se baseia em investimento no capital humano, anunciando aos países em desenvolvimento a construção de sua própria autonomia, e a garantia de melhores empregos e maior produtividade à população; desta forma, o discurso neo-liberal afirma que são dadas mais oportunidades para uma ascendente mobilidade sócio-econômica para a população de países em desenvolvimento. Assim, então, na atualidade, a educação formal e a qualificação pessoal são tomadas como elementos de vantagem competitiva da mão-de-obra assalariada, da reestruturação produtiva e da empregabilidade.

Antes de qualquer análise, desejo enfatizar a contribuição única e perspicaz deste livro.  Sem dúvida alguma, nunca houve tanta necessidade quanto na atualidade de desenvolver análises críticas do discurso neo liberal ou do empreendimento corporativo, especialmente no contexto presente das corrupções e escândalos envolvendo bilhões de dólares de corporações (como nos casos Enrom e Worldcom nos Estados Unidos), onde um grande número de pessoas foram prejudicadas.  O problema é complexo e sem soluções fáceis.  A recessão americana tem forçado os  investidores estrangeiros evitar riscos no mercado da América Latina.  Neste sentido, este livro vem trazer uma nova luz ao entendimento de tal discurso e suas conseqüências para a humanidade e omeio ambiente.  Oferece  soluções alternativas na luta contra o discurso neo-liberal pragmático e interesseiro, que limita a educação ao treino, padronização e desumanização.  Para países da América Latina e da América Central, por exemplo, a globalização tem causado um impacto na população muito maior do que o impacto queseus cidadãos sofreram com a colonização (Chomsky, 1999).  O  colapso econômico da Argentina é uma ilustração do que o país e seus cidadãos ainda estão passando, em meio a uma crise de tais dimensões.  Em outros países, empresas são forçadas a despedir centenas ou milhares de funcionários, especialmente depois do ocorrido em 11 de setembro, nos Estados Unidos, como conseqüências da globalização da economia e da guerra ao terrorismo mundial, o embrutecimento econômico passa a ser percebido, então, como a única alternativa para o problema enfrentado pela economia, ao invez de se repensar a eliminação dos ditames do mercado.

O Brasil hoje temacima de vinte por cento de desemprego e a população é forçada a aceitar tal realidade econômica e social.  As massas são alienadas e manipuladas a acreditar que aquelas são realidades inqüestionáveis, quando a realidade do poder corporativo está indo de éticas más ‘a  inexistencia de qualquer ética.  Com o estabelecimento de acordos como oNAFTA, uma conseqüência evidente é a pouca dificuldade quegrupos dominantes encontram  na exploração das classes trabalhadoras. Há, infelizmente, muita tolerância e pouca contestação da  ideologia capitalista anti-democráticae neo-liberal.  Desta forma, este livro propõe a possibilidade de anti-hegemonias, oportunizando a liberdade através da mudança de realidades opressivas para realidades democráticas e igualitárias.  Acrescenta-se a este contexto o fato de que os sujeitos ainda têm a opção de agir de modos diversos ou contrários. No entanto se salienta aqui o fato de que as estruturas ou paradigmas são as causas centrais de forjamento opressão, da carência, da desigualdade e da pobreza.  Por causa destas estruturas e sendo parte destas categorias não se constitui como resultado de uma escolha do sujeito. E o poder do mercado ou das corporações tem se tornado a força central dominante de todos os empenhos sociais.  Centenas de milhares de pessoas se deslocam de lugares em lugares em busca de emprego, seguindo o movimento de re-alocação das indústrias, e, freqüentemente, as corporações se movem para onde a produtividade e o lucro podem ser explorados ao extremo, através da máxima exploração do trabalho e do meio ambiente.  Elas se mudam para onde os sindicatos são fracos e a cidadania menos organizada. Para onde os governos fazem pouco para proteger o povo e o meio ambiente.  Por outro lado, o povo se encontra `a deriva e sob a clemência do poder corporativo trans-nacional, e  as  políticas de troca de favores e recursos repartidos coadunam com os interesses e conveniência de tal poder corporativo (Chomsky, 1999.  Novas favelas são formadas, compondo aglomerados de pessoas, e não comunidades bem planejadas.  Milhares de pessoas nestes conjuntos habitacionais são expostas a degradantes condições de vida e de saúde.  Sem esquecer dos direitos humanos que todos nós devemos defender, estes e outros aspectos se tornam  preocupações, não somente a nível local mas tambem a nível global.

Um outro aspecto que gostaria de ressaltar é  a força que o estado corporativo possui, exercendo influência considerável na natureza humana e cultural. Comporta-se como se fosse um agente todo poderoso ante o qual todos os seres humanos devem  render sua força de vontade, iniciativa, poder e destino.  Tem se transformado em entidade poderosa, que nega às pessoas a habilidade de assegurar suas crenças coletivas locais, objetivos e controle da direção de seus negócios econômicos e interesses.  E a classe trabalhadora, por ser a menos favorecida,  se torna alvo fácil  da exploração dos sujeitos do capital de estado trans-nacional.  As classes menos favorecidas constituem a maioria da população, com as pessoas mais empobrecidas e à  frente  das linhas de montagem de trabalho mecânico.  Em outras palavras, este é o impacto do empreendimento corporativo na cultura humana.  O que a globalização propõe é que o destino humano seja subjugado aos interesses corporativos através de um processo de treinamento para a automatização, ao invés da educação, da cidadania, da criatividade e do pensamento crítico; gerações inteiras são induzidas a se conformarem com uma escolarização dada e padronizada.  E, por último, tais corporações não dedicam respeito cívico aos países  que visitam e exploram.

Este livro examina, assim, aspectos importantes e relevantes do capitalismo, e apresenta também alguma discussão sobre o  patriarcalismo, dentro de um contexto paradigmático neo-liberal em consonância com a  globalização.  No entanto, este livro deixa de analisar os aspectos raciais de índole excludente ou includente.

Os autores examinam perspectivas amplas que situam e explicam a historicidade social, econômica e a realidade cultural, e como se conectam ‘a um sistema educacional desigual e excludente, entretanto eles deixam de incorporar as consequências da hegemonia branca. Os  efeitos da branquitude nestes contextos são pertinentes em tal análise ampla de estruturas hegemônicas da educação e perspectivas da força laboral.  A branquitude é aqui definida de acordo com os  padrões, domínio e hegemonia racial branca desde a época colonial até a atualidade, onde a identidade branca é construídaem privilégios que são negados a outros grupos étnicos não brancos.

Por exemplo, uma pergunta necessária e digna de questionamento é:  quem são os excluídos? Ditade outra maneira, quem se beneficia com a globalização e o neo-liberalismo? Estudos feitos no Brasil e nos Estados Unidos asseguram que até mesmo entre pessoas paupérrimas, as de pele mais escura são as mais excluídas e subjugadas ‘a pobreza, em comparação a uma maioria quase exclusivavamente branca e em posições de privilégio, o que revela uma necessidade vital de dirigir o olhar para como são tratadas as desigualdades raciais segundo a ótica do discurso marxista, e também dos discursos da  globalização da economia e da crise do trabalho (Cunha, 1988).

De acordo com Allen, (2001), o discurso marxista não se posiciona de forma adequada ao abordar assuntos de ordem racial, porque a maioria daqueles que se identificam como acadêmicos marxistas são brancos.  Segundo ele,  há uma necessidade de encontrar um equilíbrio entre o discurso marxista e a nova teoria racial crítica (critical race theory)--esta possui um foco maior na questão ou totalidade racial, em vez de tratar as questões de classe e de gênero como meras totalidades primordiais e absulutas.  Em outras palavras, algumas críticas marxistas deixam muito a desejar quando se trata de “balancear” discursos de classe, etnia e gênero, uma vez que se centram fundamentalmente no problema da classe social.  Etnia e gênero passam despercebidas como categorias tão opressoras quanto a questão de classe.  Desta forma, uma análise abrangente necessita incluir não somente a variável classe social e sua relação com a exclusão, como também as questões raciais e de gênero.

O livro em questão, apesar de escrito em 1998, discute realidades extremamente atuais e nos mostra a pouca ou ausente mudança social (e que a realidade presente nos oferece a todo momento, como o episódio de 11 de Setembro).  Como a teoria racial crítica ainda necessita  ampla divulgação, entendemos que novas reflexões estão por surgir.  Por exemplo, como o Brasil foi um dos últimos países da América Latinaa conceder liberdade aos escravos, a disseminação da conscientização a respeito da implementação da ação afirmativa está apenas começando a se tornar uma realidade, mesmo que nos Estados Unidos ela esteja vagarosamente se apagando com os mais recentes flagelos da arrogante dominação patriarcal da direita branca.  Sem esquecer a opinião de vários pesquisadores sobre o capitalismo e a idéia de que ele  tem sido global desde a colonização européia, que trouxe consigo e reinventoua idéia da branquitude,  do privilégio branco, ou, em outros termos, do racismo internalizado. O capitalismo tem sido, ainda, a maior estrutura hegemônica (tanto quanto o patriarcalismo), e sem dúvida alguma, o imperialismo europeu e suas analogias contemporâneas da globalização econômica podem ser incluídos no que Allen, ( 2001) denomina como globalização da supremacia branca.  Deste modo, a análise dos fracassos do capitalismo e das crises do trabalho e da educação pode também ser feita dentro deste contexto da globalização da supremacia branca.  De qualquer modo, o livro em questão traz uma valiosa contribuição no que diz respeito às questões da globalização da economia, das armadilhas do capitalismo e do neo-liberalismo, das relações entre globalização e crise do trabalho,  que figuram tão importantes quanto a necessidade de eliminação das crenças subjacentes à branquitude e ao patriarcalismo.

Referencias Bibliograficas

Allen, R. L. (2001).  The globalization of white supremacy:  Toward a critical discourse on the racialization of the world.  Educational Theory.  Fall, Vol. 51, number 4. 

Chomsky, N. (1999).  Latin America: From colonization to globalization.  Australia: Ocean Press.

Cunha, L. A. (1988).  Educação, Estado e Democracia no Brasil.  [Education, State and Democracy in Brazil].  Sao Paulo: Tabela 1-5, PNAD, 1988.

Rossatto, C.A. (2001).   Social Transformative Pedagogies:  Grass root and popular schooling in Brazil. Childhood Education International Journal.  Fall.

Note

Agradecimentos especiais ‘a Paula Botelho pela edição de linguagem. Paula Botelho e’ doutoranda do Programa "Language, Literacy and Culture", University of Maryland, Baltimore County (UMBC).

Sobre o Autor do Livro

Gaudêncio Frigotto e Maria Ciavatta, é professor do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense.

A Respeito do Resenhista

César Augusto Rossatto é professor adjunto da Universidade do Texas em El Paso (UTEP).  Leciona cursos de pedagogia crítica, multiculturalismo crítico, justiça social, sociologia da educação, e fundamentos sociais, históricos, e filosóficos.  Ē comprometido com a militância pela justiça social, pelaeducação dialética e dialógica, com o intuito de promover a praxis de libertação dos grupos menos favorecidos. Ētambém especializado na filosofia de Paulo Freire, nas teorias temporais críticas, no contexto social da educação, políticas organizacionais e educação urbana.  Ē também especialista em estudos culturais comparativos dos Estados Unidos e da America Latina, com foco maior na cultura brasileira. Seus interesses de pesquisa incluem: Fronteiras estadounidense e  mexicana e suas relações com o contexto da globalização e o neo-liberalismo; formação das relações sociais e identidade brasileira na Flórida, bem como suas implicações no processo de escolarização; os fenômenos do fatalismo e dootimismo e suas relações com a inserção em diferentes classes sociais,aplicação da pedagogia crítica; os efeitos da branquidão no Brasil e nos Estados Unidos. Algumas de suas publicações incluem: Transformative optimism:  Engaging Paulo Freire’s pedagogy of possibility.   New York, NY:Peter Lang Publishing, Inc, Forthcoming book.; The Freirean legacy:  Educating for social justice.   Peter Lang Publishing, Inc. 2002.; The whiteness experience in contrast with racial conflicts:  Studies of Brazilian and U.S. American realities.  This is a co-authored book chapter, which was published in Brazil, São Paulo: Summus, 2001.


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