jueves, 29 de mayo de 2025

Gentili, Pablo & Suárez, Daniel (Orgs.) (2004). Reforma educacional e luta democrática: um debate sobre a ação sindical docente na América Latina. São Paulo: Cortez. Resenhado por Sandra Sales

 

Gentili, Pablo & Suárez, Daniel (Orgs.) (2004). Reforma educacional e luta democrática: um debate sobre a ação sindical docente na América Latina. São Paulo: Cortez.

125 pp.           ISBN 85-249-1091-7

Resenhado por Sandra Sales
UERJ

Abril 17, 2006

Reforma Educacional e luta democrática: um debate sobre a ação sindical docente na América Latina é muito mais que uma reflexão de seus organizadores, pois materializa os resultados de um intenso trabalho coletivo desenvolvido em vários países da América Latina, sob a coordenação do Observatório Latino-americano de Políticas Educacionais (OLPED) do Laboratório de Políticas Públicas (LPP), sediado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, no Brasil. Trata-se de uma sistematização das principais reflexões feitas no primeiro debate promovido pelo Fórum Virtual2 promovido pelo Fórum Latinoamericano de Políticas Educacionais (FLAPE), que além do OLPED, é composto por outras quatro instituições: Programa Interdisciplinar de Pesquisa em Educação do Chile (PIIE), Fórum Educacional do Peru (FE), Universidade Pedagógica Nacional da Colômbia (UPN) e Observatório Cidadão da Educação no México (OCE).

O livro segue, em certa medida, a organização do Fórum Virtual, visto que apresenta um texto base elaborado pelos seus organizadores (“A polêmica”), que origina, por sua vez, quatro textos de discussão elaborados por membros ou grupos pertencentes às demais organizações que integram o FLAPE, além de um outro texto produzido pelos autores do texto base, que retoma, aprofunda e repensa, as observações e as críticas tecidas pelos textos de discussão (“O debate”). Integra também este livro, um último capítulo enfocando a pesquisa sobre conflitos educacionais na América Latina.

A opção metodológica da pesquisa, fundada em enfoque quantitativo e qualitativo, resultou em uma extensa cronologia sobre os conflitos docentes nos 18 países estudados que foram levantados a partir de pesquisa feitas nos principais jornais de cada país, bem como em 5 estudos de caso realizados por pesquisadores da Argentina, Brasil, Equador, México e Peru. Foram utilizadas outras fontes como imprensa sindical, estudos e pesquisas, bem como foram realizadas entrevistas.

Muito embora os organizadores da pesquisa destaquem as limitações da abordagem da pesquisa, pela sua incapacidade de “determinar dinâmicas específicas e certas características peculiares a cada caso nacional” (p.33), a metodologia adotada na referida pesquisa merece destaque. A abrangência da pesquisa, tanto em termos da quantidade de países investigados, quanto da extensão do período por ela coberto, permitiu a construção de um dos maiores bancos de dados sobre a conflitividade docente na América Latina, além de “oferecer uma visão de conjunto que pode contribuir para a reflexão crítica e rigorosa acerca de uma das questões mais polêmicas da pesquisa sobre políticas educacionais nos países da região” (p.33).

Outro destaque se deve ao fato, não apenas, de nela recaíram muitas das críticas feitas pelos debatedores da Colômbia, Peru, México e Chile, mas, sobretudo por utilizar como um dos procedimentos metodológicos um estudo feito em grande parte na mídia, que se constitui um dos principais “formadores da opinião pública”, para usar um jargão utilizado pela própria mídia. Apreender e refletir sobre as tendências apresentadas pela mídia é, sem dúvida, uma tarefa fundamental para educadores e pesquisadores preocupados com a luta política e ideológica travada no interior das sociedades e comprometidos com a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. A mídia não é neutra. Apesar de algumas contradições, ela está longe de ser um instrumento polifônico, ou seja, está longe de contemplar as divergentes vozes presentes na sociedade, já que representa, via de regra, os interesses dos grupos dominantes.

Nesse sentido, a pesquisa é extremamente oportuna, por dar relevância à voz das organizações sindicais do magistério, uma das vozes bastante silenciadas nas sociedades latino-americanas no contexto das reformas operadas pelos chamados governos neoliberais, que claramente seguem orientações de organismos internacionais como o Banco Mundial e o BIRD.

Gentili e Suárez ao discutir a conflitividade docente, o fazem com a preocupação de contextualizá-la, já que se insere em um cenário de crise econômica e de ajustes estruturais. A primeira seção do texto base intitula-se “A reforma educacional como cenário do conflito” afirmando que nos últimos 20 anos houve, na América Latina uma “ampliação, diversificação e intensificação dos conflitos sociais e políticos”. Destaca-se nesse processo o setor sindicalizado (público e privado) como protagonista da maior parte dos movimentos e 3A pesquisa foi desenvolvida pelo Observatório Latino-americano de Políticas Educacionais (OLPED) do Laboratório de Políticas Públicas (LPP) no Rio de Janeiro e em Buenos Aires em conjunto com o Escritório Regional de Educação para a América Latina e Caribe (OREALC) da UNESCO (Santiago do Chile) resistências promovidos pelos governos neoliberais, dentre os quais chamam a atenção as lutas promovidas pelos setores docentes.

Dentre o conjunto de informações e reflexões apresentados nessa primeira seção do texto base, os autores apresentam os principais temas em disputa entre sindicatos docentes e Estado, o principal antagonista das lutas travadas: condições salariais e trabalhistas de professores e mestres, o orçamento para a educação, a falta ou a precariedade de incentivos e estímulos econômicos para o setor, os acordos coletivos de trabalho do setor e outras normas que regulam o trabalho nas instituições educacionais e a questão da capacitação e do aperfeiçoamento profissional.

A agenda apresentada pelos sindicatos docentes, apesar de ser considerada importante, foi também criticada pelos autores que a consideram reducionista, parcial, desarticulada e com resultados apenas de curto prazo. Para os autores tanto as políticas educacionais implantadas pelos governos neoliberais, quanto as respostas e reivindicações propostas pelo sindicalismo magisterial demonstraram a “ausência de uma perspectiva global e holística, que tenda a problematizar e articular em uma política docente integral as diversas dimensões envolvidas com a organização e gestão do exercício do ensino nas instituições educacionais” (p.24).

Com relação à evolução e ao desenlace dos conflitos educacionais dos países da região, os autores fazem referência à existência de um “certo caráter cíclico”, que se materializa em um primeiro momento na confrontação através de greves e mobilizações protagonizadas pelo setor docente e seus sindicatos contra o Estado; dá-se em seguida a negociação; seguida por sua vez de acordos geralmente precários e de curto prazo; ocorre, na maioria dos casos, um período de relativa estabilidade; e, finalmente, fechando o ciclo, intensifica-se uma nova rodada de confrontações e conflitos.

Na segunda seção do texto base Gentili e Suárez apresentam uma importante reflexão teórica que denominaram “Conflito educacional: a caminho de uma definição teoricamente ambiciosa”, onde se dedicam à conceitualização do conflito educacional e afirmam: “nossa noção de conflito educacional, baseia-se no caráter processual e dialético da conflitividade política. Ou seja, pretende analisar os processos que constituem e dão sentido à conflitividade”. (p.31).

Na terceira seção é apresentada “Uma cronologia da ação sindical docente”, onde os autores disponibilizam, com riqueza de detalhes, os resultados obtidos e apontam algumas tendências. Para citar apenas um exemplo, considerado pelos autores como impactante, a pesquisa revelou que, no período investigado, os conflitos tiveram uma longa duração, ou seja, houve no período 4.802 dias de conflito educacional, o equivalente a 2,6 protestos por dia, considerando que o período analisado compreende 1.825 dias. Os países com maior número de incidência de conflitos Educacionais foram Argentina, Brasil e México. Nas “Considerações finais” os autores afirmam, com base na pesquisa realizada, que os processos das reformas educacionais levadas a cabo nos países da região, coincidiram com um “aumento notável da conflitividade educacional, convertendo-a no principal protagonista da crescente conflitividade social da região”.(p.45).

O texto faz referência às chamadas “políticas de acordo” implementadas no período, centradas principalmente nos mecanismos de descentralização da gestão das escolas e na criação de instâncias de acordo e negociação, que por sua vez, se mostram contraditórias às políticas de currículo e avaliação homogeneizadoras centralmente desenhadas. Gentili e Suárez se questionam sobre a efetividade das políticas de acordo diante das intensas e prolongadas lutas que acompanharam todo o período das reformas educacionais. Interrogam-se ainda se tais políticas se constituíram em verdadeiros instrumentos de deliberação coletiva ou se pelo contrário, se constituíram em mecanismos de legitimação de discurso e da reforma educacional.

Reforma educacional e luta democrática

Sobre “O debate”, que se travou a partir do texto base os autores ressaltam que os textos produzidos pelos debatedores da Colômbia, Peru, México e Chile, apesar das divergências, concordam entre muitos aspectos, nos seguintes: na necessidade de contextualizar historicamente os conflitos educacionais; no entendimento de que a abordagem da conflitividade social e educacional deve ser mais profunda e complexa e, conseqüentemente, mais integral e dinâmica; na centralidade das lutas educacionais no campo do conflito social; na compreensão de que no âmbito da problemática educacional os docentes e suas organizações assumiram o protagonismo (embora não exclusivo), enquanto os governos se constituíram os principais antagonistas.

Pode-se afirmar que todos os textos de discussão contribuíram para o aprofundamento da questão da conflitividade educacional, utilizando para isso pelo menos duas diferentes estratégias discursivas e argumentativas. A primeira, adotada pelos debatedores colombiano e peruano, consiste em apresentar e analisar aspectos da conflitividade educacional em seus países. A segunda estratégia priorizou ressaltar e criticar aspectos teóricos, conceituais e metodológicos da pesquisa, sendo os casos nacionais utilizados apenas para ilustrar e exemplificar os argumentos utilizados por seus autores. Finalizando o debate, mas sem pretender encerrá-lo ou esgotá-lo, Gentili e Suárez apresentam “Novas e não tão novas questões sobre os conflitos educacionais na América Latina: algumas respostas e questionamentos”. Além de reagirem às críticas feitas ao texto base, os autores apresentam uma série de “dimensões, eixos e questionamentos para futuras pesquisas e debates”, identificados por eles nos textos de discussão, dentre os quais destacase: “o peso relativo da conflitividade educacional no contexto mais geral da conflitividade social latino-americana e da implementação de políticas e reformas neoliberais”; “o peso relativo dos enfrentamentos entre sindicalismo magisterial e o Estado, no contexto mais geral da intensa conflitividade educacional vivida nos países da região”; “a existência de outros conflitos e tensões que, no campo educacional, agregam-se de forma direta e indireta às reivindicações do magistério ou, em alguns casos, são totalmente a ele”. A última parte do livro é dedicada à pesquisa sobre conflitos educacionais na América Latina e se subdivide em 3 seções: “Acerca das fontes de pesquisa bibliográfica sobre movimento sindical na América Latina”; “Banco de dados sobre a ação sindical docente na América Latina” e Organizações sindicais docentes na América Latina”. Reforma Educacional e luta democrática: um debate sobre a ação sindical docente na América Latina é, sem dúvida, um importante trabalho para sindicalistas e pesquisadores, mas também para todos os educadores preocupados com o rumo da educação em seus países, mesmo que não sejam militantes ou sindicalizados.

A cerca dos autores do livro
Pablo Gentili é professor do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Pesquisador do Laboratório de Políticas Públicas (LPP) na mesma universidade, onde coordena o Observatório Latino-americano de Políticas Educacionais (LPP/OLPEd). É autor de numerosos livros e artigos publicados em vários idiomas sobre políticas educacionais no Brasil e na América Latina.

Daniel Suarez é professor da Universidade de Buenos Aires e coordenador executivo da sede de Buenos Aires do LPP. Desenvolve um amplo projeto de pesquisa sobre memória e documentação do trabalho docente. Publicou diversos artigos em vários países da América Latina, sobre políticas educacionais, reformas curriculares e formação de professores.

A cerca da resenhadora do livro
Sandra Sales é Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação (PROPEd) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Atualmente é visiting scholar na Arizona State University (ASU) como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Agência do Ministério da Educação do Brasil. É autora de vários trabalhos sobre políticas Educacionais no Brasil.

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